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Tu Partilhas... #1 - "Podem sentar Ronaldo no banco… mas o trono ninguém lho tira."

 




Olá Butterflies! 


Já há algum tempo que queria fazer um "cantinho" aqui no blog onde possa postar partilhas/desabafos de quem sinta necessidade/vontade de o fazer. Não tem de ser algo negativo, não tem de ser só más experiências, pode ser qualquer coisa que se tenha vontade de partilhar com os outros. Que seja apenas para deitar cá para fora, que seja para de certa forma ajudar alguém, que seja para fazer alguém sorrir... Não tem de ser assinado, se não pretenderem.

Perante o que se passou/passa e perante o desfecho de ontem (Portugal saiu do mundial 😞), acho que vou começar este "cantinho" com esta partilha que vi.


Para refletir...







“HOJE VAIS FICAR NO BANCO. PARA APRENDERES!” 

“A forma como lidamos com os tropeços alheios – sobretudo os de quem já tantas alegrias nos deu – diz muito mais sobre nós, do que sobre quem escorregou e caiu.”

A perda de memória é reflexo da perda crescente de caráter e da espessura humana. A sociedade está a transformar-se num retalho de emoções sintéticas que se reciclam dia após dia. O poder aconchegante, respeitador, quente e protetor da manta que passava de geração em geração perdeu-se. E,nessa perda, esvaziam-se uma série de vidas dentro de várias vidas. Perdendo-se a essência perde-se a humanidade. O que nos define, com humanos, não é a identidade, é a memória e a consciência da identidade. Perdendo-se a memória a identidade deixa de fazer sentido. Deve estar para breve a substituição de obras de arte como Mona Lisa, Guernica, L’Homme au doigt, A Noite Estrelada, A Persistência da Memória (…), por impressões a laser de alta qualidade e cópias ainda mais luminescentes que as originais. Mas é nesse excesso de luz que se esvazia o que de bom têm as obras de arte originais. Essas carregam a emoção de alguém que conseguiu, de forma extraordinária, organizar elementos e criar algo que desperta o melhor dos sentidos. Cada uma dessas obras de arte é o reflexo do melhor que há em nós. São intemporais, insubstituíveis e necessárias. A sua destruição, substituição ou ajustamento não destroem só a obra de arte: destroem também uma parte da nossa identidade como pessoas e humanidade. 

Quando colocamos um ponto de vista acima daquilo que é a realidade estamos a pisar uma linha perigosa que se chama boato, opinião ou mentira. 

É importante ver a ilha de fora, mas é também importante estarmos conscientes que escolhemos a distância ideal entre nós e a ilha, a distância certa que permite observar e não olhar. Se nos afastamos demasiado da ilha podemos correr o risco de fazermos uma análise desajustada, baseada em hipóteses, e, certamente, falsa. 

Não percebo muito de futebol. Mas percebo o suficiente de relações humanas e sociais para poder dizer que o que se está a passar com Ronaldo é algo profundamente desprovido de razão. 

Quando vemos futebol, principalmente a seleção, não estamos só a ligar a televisão e a ver a magia da imagem. Estamos também a projetar tudo aquilo que somos, queremos e por vezes não atingimos. Porque a seleção é, ela mesma, tal como uma obra de arte, uma parte de nós. Mas nós, que assistimos, por muitas projeções que façamos, só assistimos, só vemos. Nessa ação algo passiva de ver, se perdermos a memória, facilmente podemos cometer um grave erro: perdermos a identidade coletiva. 

“O alerta do New York Times, em modo “breaking news”, mostrou bem a dimensão planetária do que se está a passar: “Portugal mete Ronaldo no banco”. “

Esta notícia está certa. Não foi Fernando Santos que colocou Cristiano no Banco. Fomos todos nós: uns punhados no meio destes pequeninos 10 milhões. O maior português de sempre com a bola nos pés, uma das maiores obras de arte no mundo do futebol, o mais amado por esse mundo fora, ficava de fora do leque dos escolhidos para a seleção nacional lusitana. Uma decisão, dita, escrita e repetida por comentadores como sendo “disciplinar, porque Ronaldo, demasiado centrado em si próprio, não respeitou o treinador no último jogo, e uma decisão estratégica arriscada de Fernando Santos.” Aponta-se falta de disciplina a um dos profissionais mais disciplinados. 

Quem poderá dizer coisas do género “É para aprender!” “Assim já vê quem manda!”.  Ao dizermos tais coisas estamos a colocar o Cristiano no banco. Com o Cristiano no banco vai também para “o banco” muito de bom que há em todos nós. E vai-nos permitir dizer: 

-“Tu, trabalhador que dás o teu melhor, com entrega e paixão, que ainda fazes um bom trabalho, a partir de amanhã vais ficar em casa para aprenderes. Assim já vês quem manda!”

-“Tu, aluno dedicado, que dás o teu melhor, tens tirado boas notas, ainda tiras boas notas, mas já estás cansado, amanhã vais ficar em casa, sentado, para aprenderes. Assim já vês quem manda. “

-“Tu, mãe de família, que sempre fizeste o melhor pelos teus filhos, trabalhaste arduamente e foste um exemplo, mesmo ainda fazendo bem as tarefas de casa e ajudando a tua família, estás velha. EU PENSO que o melhor para ti é ires já para o lar. Para aprenderes. Assim já vês quem agora manda. “

Analisemos o desempenho de Ronaldo. Foi Bom. O jogo que perdemos não foi só Ronaldo. Foi a equipa(como sempre é). Nesse jogo entrou Leão mas não marcou, foi substituído Ronaldo e não vi a equipa a jogar mais. Cada jogo é um jogo. “No último jogo por karma, talento e uma pitada de sorte, o substituto de Ronaldo, que só entra ao minuto 73, marca três golos e dá outro a marcar. Um estádio clama por Cristiano. Ele entra e não marca (até marca  mas é assinalado fora de jogo). Acontece pois a goleada, e ela não vem dos pés do madeirense. Gonçalo Ramos é o homem do jogo. Uma nação exalta-se, o mundo pasma: a equipa que jogava para ele e por ele, não só subsiste como brilha sem ele. Será possível que Portugal tenha novo herói? É Portugal grande sem o grande Ronaldo?”

Tenho um filho de 7 anos, que nem gosta muito de jogar futebol, não tem em si a emoção criada dos relatos dos golos de Cristiano, da magia das suas fintas e passes, da ajuda que prestou (e presta) a tantas instituições…. Mas para ele a seleção é Cristiano. Pergunta-me “porque é que o Cristiano hoje não joga?” (E desliga do jogo, porque Cristiano não joga). E eu não lhe sei responder. Porque para responder teria de lhe dizer a verdade: Cristiano não joga porque está a ser vencido pela inveja e pela ingratidão. Pelo “vencer a todo o custo”. Estaria a correr o risco de criar, na mente da criança que é o meu filho de 7 anos, a ideia que, a inveja e a ingratidão podem ser fontes de vitória. Algo que de todo não quero. 

Quero que o meu filho continue a ver o exemplo de resiliência, de trabalho, de exemplo, de superação, de entrega, de paixão, de inspiração que o Cristiano criou  e cria em muitos de nós. Essa identidade é criadora de sucesso, não a inveja. 

Até o Futebol já não é o que era: continua a ser 11 contra 11, mas a Alemanha já saltou fora do Mundial e de início não jogou Ronaldo. E a Espanha também. Será a culpa de Ronaldo? Ou falta-lhes a identidade que o Ronaldo dá à nossa seleção e ao nosso país? É a primeira vez que não foi titular num jogo decisivo da equipa lusitana. Já se faria sobejamente História, acabasse o jogo com uma entrada do capitão na segunda parte. “Mas Portugal é dado, nestas coisas da bola, a volte-faces de filme e a emoções fortes.”

“Deste futebol percebo quase nada, mas percebo alguma coisa de trabalho de equipa e, sobretudo, de emoções.” Não tenho dúvidas: este mundial vai ser do Ronaldo. Já o é. E a seleção vai continuar com ou sem Ronaldo. Mas o Ronaldo já não pertence à seleção, nisso estão certos os que o colocam no banco. Ronaldo é o nome, o autor da criação de uma obra de arte que pertence à humanidade. 

“Haverá quem fique feliz com isso, a mim dói-me de ver sair Ronaldo, no final, sozinho em direção ao balneário, emoções em ebulição, enquanto a seleção festeja. A mim deixa-me triste porque o percebo. Como é penoso ver as manifestações de alegria com a tristeza alheia. Os alemães chamam-lhe “schadenfreude”, por cá não temos nome para a pior manifestação da inveja. Mas é fácil de identificá-la. Não é bonita.

O maior jogador do mundo é também um homem e a sua circunstância: a de quem naturalmente “envelhece” e tropeça à vista do mundo inteiro, com todos os holofotes e todas as câmaras voltadas para ele. Captando cada esgar, cada sinal de frustração, cada engolir em seco, cada olhar aos céus a perguntar pela boa estrela que teima em não lhe assistir agora, no início do fim da sua espetacular carreira. Tentemos calçar as suas chutarias de ouro. Tentemos imaginar o que isto custa.” É impossível imaginar, pois é! Porque nem de perto nem de longe conseguiremos ser quem Ronaldo é. Falhar é sempre duro. Falhar lá de cima do pedestal é esmagador. Insuportável. Inimaginável.

Quem não tropeça em si mesmo nesta vida”, perguntou um dia António Lobo Antunes, numa crónica da Visão. Não se duvide: mesmo os maiores, os melhores, tropeçam nos próprios pés. Fazem merda. Desiludem. Erram. E a forma como lidamos com os tropeços alheios – sobretudo os de quem já tantas alegrias nos deu – diz muito mais sobre nós, do que sobre quem escorregou e caiu.

Ronaldo, o maior, tem ainda muito mais para dar ao País, ao mundo, ao futebol e às pessoas. Mas tem agora uma decisão fundamental, a mais importante da sua carreira: como gerir a frustração e encarar o inevitável, aceitando que não será o maior para sempre? Perceber que há grandeza além dos golos. Perceber que há magia além das quatro linhas. Perceber que, enquanto houver Ronaldo e a memória dele o mundo será sempre um mundo melhor.

Podem sentar Ronaldo no banco… mas o trono ninguém lho tira. 

 

(Marco Aurélio Neves, 8 de dezembro de 2022.)






Não sei se é algo que vá ter adesão mas...

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(título: #TuPartilhas)




Beijinho,
Ana Pachêco ʚĭɞ

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